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O Rio precisa tornar de?nitiva a intervenção federal

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Com sua classe política atrás das grades, falido, debaixo de intervenção, chegou a hora da verdade para os fluminenses. Sabe-se que as causas de sua crise não são apenas fiscais. Trata-se de uma longa crise iniciada com a transferência da capital federal e agravada pela fusão imposta pela ditadura em 1975, entre o antigo Distrito Federal e o antigo Estado do Rio. Data dessa época a perda progressiva da antiga centralidade política e econômica da região e a consequente deterioração de todos os serviços antes sustentados pelo governo federal: educação, saúde e segurança pública. A decretação de uma intervenção federal formal, depois de inúmeras informais, constitui tanto o ápice desse processo quanto a comprovação cabal do fracasso do “novo Estado do Rio” inventado pelo general Geisel. 

Comparado a outros estados do mesmo porte, o artificialismo político do Estado do Rio é evidente. Hoje, quando sua classe política se encontra dizimada, fica mais fácil perceber que ele nunca conseguiu forjar elites capazes de governá-lo a contento. Sua capital estadual é também aberração – porque é tudo, menos “estadual”. É a única cidade “nacional” do Brasil, onde tudo o que acontece repercute no todo, de forma positiva ou negativa. 

Mas, além de “nacional”, o Rio também é “federal”: sedia mais de 50 órgãos federais; tem mais servidores federais que estaduais e possui mil e trezentos imóveis administrados pela União. O Estado do Rio, artificialmente criado, é um verdadeiro Frankenstein. Embora seu interior pareça com o Espírito Santo, sua capital é quase tão grande quanto São Paulo e tão “federal” como Brasília. 

Diante desse quadro, é preciso tirar partido da desgraça, aproveitando a intervenção federal para tentar a solução definitiva, que passa por reconhecer o fracasso do experimento de 1975 e separar aquilo que a ditadura juntou: o antigo Distrito Federal e o antigo Estado do Rio. Novamente assentado em Niterói, o novo governo estadual se livraria dos funcionários federais, retomaria sua identidade especificamente fluminense e, mais homogêneo em matéria de elites políticas, seria mais governável do que hoje é.  Entre outras coisas, o governo do estado poderia voltar suas atenções em matéria de segurança pública para o interior (São Gonçalo, sobretudo), pondo fim à drenagem do contingente policial pela macroscópica capital atual. 

Já a cidade do Rio deixaria de ser essa bizarra capital estadual disfarçada de federal para ser devolvida à União e assumir sua condição de cidade nacional. Isso poderia ser feito, ou lhe restituindo o antigo estatuto de distrito federal, sendo gerida como Brasília, ou criando-lhe outro, especial: o de cidade federal, que foi aquele criado pela Alemanha e Rússia para administrarem suas antigas capitais, Bonn e São Petersburgo. Em qualquer dos casos, o governo local arrecadaria os impostos municipais e estaduais, ficando o federal responsável pela segurança pública. Em qualquer dos casos, os municípios limítrofes da Baixada deveriam ser incorporados à cidade do Rio novamente federalizada, o que se poderia fazer mediante plebiscito. E se tornaria definitiva a intervenção federal na área de segurança, hoje provisória.

Cariocas e fluminenses precisam dar a mão à palmatória e reconhecer dois fatos insofismáveis: 1 - a incapacidade da antiga capital da República de sobreviver sem a presença permanente do governo federal; 2 - as imensas dificuldades que, por seus problemas ciclópicos e características únicas, ela cria à governabilidade do Estado do Rio. Voltar a separá-los, estadualizando o interior e federalizando a capital, lhes permitiria reconstruir em melhores bases seus quadros políticos e respectivas polícias, hoje arruinados pela corrupção. A região como um todo ficaria mais governável e os brasileiros recuperariam para si, a um custo globalmente muito baixo, sua cidade nacional hoje em frangalhos. Deve-se tirar partido da desgraça para ousar dar ao problema fluminense a sua solução definitiva.

*Professor do IESP-UERJ e da Fundação Casa de Rui Barbosa