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Força, Rocinha! 

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Passados quase dois meses do início dos confrontos na Rocinha, e mesmo ainda vivendo momentos complexos, é possível fazer alguns apontamentos e reflexões do momento e do sentimento que nós moradores estamos vivendo. De fato, não podemos negar que a Rocinha não conseguiu se recuperar. 

O medo e a insegurança passaram a fazer parte ainda mais do cotidiano do morador que constantemente se depara com confrontos ou notícias de tiroteios. Tal insegurança tem refletido diretamente nas opções de cultura e lazer, uma vez que muitos dos eventos e festas não estão acontecendo. E sair da Rocinha nem sempre é uma opção, já que não se sabe a possibilidade de retorno.

Famílias continuam deixando a favela. Vemos caminhões de mudanças, sonhos, expectativas e lagrimas deixadas para trás. Os comércios como bares, salões de cabeleireiro, depósitos, entre outros estão sofrendo com a falta da clientela. Hoje, muitos moradores que sempre foram felizes na Rocinha já afirmam ter medo. Eu também tenho esse medo. Os becos e ruas seguem mais vazios e escuros, a animação que é uma característica forte da Rocinha ainda não conseguiu retornar naquela que é uma das maiores favelas do mundo. 

A reflexão da Rocinha pode ser desanimadora, mas como morador daqui desde sempre, sofro muito com a angustia do momento. Mas, carrego comigo a certeza que dias melhores virão. Continuo a afirmar que a Rocinha é muito mais que violência, e que nestas ruas, becos e vielas tudo vira palco para arte. A Rocinha é formada por moradores, guerreiros. Um povo trabalhador que carregou muita água na cabeça e que os jovens agora saem de suas casas mesmo com tiroteio e todas dificuldades para tentar ingressar em uma universidade. E conseguem. Vemos que nossos jovens estão chegando lá e mostrando a força do favelado. 

Escrevo hoje um texto que se inicia triste, mas se encerra com esperança. Pode parecer confuso, mas esse é o meu sentimento de morador. Força, Rocinha! 

* Davison Coutinho, morador da Rocinha desde o nascimento. Bacharel em desenho industrial pela PUC-Rio, Mestre em Design pela PUC-Rio, membro da comissão de moradores da Rocinha, Vidigal e Chácara do Céu, professor, escritor, designer e liderança comunitária na Comunidade