ASSINE
search button

O rei da valsa

Compartilhar

Numa época em que as lojas de partituras praticamente acabaram, dando lugar a um mercado de pirataria e cópias muitas vezes repletas de erros, é louvável o lançamento de uma edição de luxo feita com tanto esmero das “24 valsas  brasileiras”, de Francisco Mignone, editada pela Tipografia Musical, com supervisão da pianista e viúva do compositor, Maria Josephina Mignone. 

Gênero de música muito popular na Europa do século XIX, a valsa foi nesse período a música da moda para se dançar nos salões da elite austríaca, tendo Strauss entre os mais famosos compositores. 

De lá para cá, outros compositores, como Schubert, Chopin, Ravel, propuseram suas versões para o gênero, modificando com frequência o caráter original da dança, a tal ponto que de comum com a valsa vienense às vezes resta somente o compasso ternário (três tempos por compasso, ou seja, uma pessoa para dançar uma valsa contará de três em três). 

No Brasil, o compositor Francisco Mignone (1897-1986) escreveu tantas valsas que foi chamado pelo poeta Manuel Bandeira de “Rei da valsa”. Mignone escreveu valsas para diversos instrumentos, como o fagote, o violão, tendo composto para o piano séries como a das “Doze valsas de esquina” (19401943), a das “Doze valsas-choro”(1946-1955) e a das “24 valsas brasileiras (1965-1984), chegando a compor mais de cem. 

Maria Josephina diz que “Mário de Andrade, que era amigo de meu marido, criticava-o por sua música estar europeizada depois de anos de estudos na Itália e o incentivou a usar mais elementos da música brasileira em suas composições”. 

Daí, nasceu a parceria com Mário de Andrade e algumas das principais obras de Mignone, como a suíte “Festa das igrejas” e o bailado “Maracatu do Chico Rei”, ambas usando mais elementos nacionais do que nas composições anteriores. 

Nas valsas, Mignone resgata um gênero tipicamente europeu, ao qual mescla melodias brasileiras, deixando-se influenciar pelo caráter das modinhas, das serestas e dos choros, resultando numa valsa de perfil bem nacional.

 Indagada sobre qual seria a sua valsa preferida, Maria Josephina hesitou em responder: “Todas são lindas, nem gosto de escolher uma, mas a ‘12ª valsa de esquina’ é muito brilhante e abrange, por sugestão de Mário de Andrade, todas as notas do piano”. O compositor leva o seu projeto de valsas até quase o final da vida, quando compôs, em 1984, a sua última “Valsa brasileira”. 

A nova edição das “24 valsas brasileiras é publicada em edição “urtext” (versão impressa que visa ser o mais próximo possível do original do compositor) e contou com a supervisão técnica de Maria Josephina, a quem o compositor dedicou boa parte delas, além de tê-la orientado sobre detalhes da interpretação.

A coleção está registrada em CD por Maria Josephina, que, desde o falecimento de Mignone, vem divulgando sua obra, tendo inclusive criado o Centro Cultural Francisco Mignone (Rua Barata Ribeiro, 774 sala 12, em Copacabana). A pianista lançou em 2016 uma seleção de correspondência trocada pelo casal, “Cartas de amor”, cujo interesse, segundo Maria Josephina, é o de “mostrar a alma do compositor e o grande homem que ele foi”. 

Serviço

24 valsas brasileiras’ (piano) - Obras de Francisco Mignone, com supervisão técnica de Maria Josephina Mignone, pela Tipografia Musical. Sessão de autógrafos com Maria Josephina Mignone. 23 de março, às 19h, na Livraria da Travessa (R. Visconde de Pirajá, 572 – Ipanema; 3205-9002) 

* Especial para o JB