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Começa ciclo de palestras sobre escritores refugiados, exilados e em risco

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Começa hoje e vai até setembro, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), o ciclo internacional de debates “A palavra fora do lugar: escritores refugiados e em risco”. O tema das migrações forçadas será abordado em cinco encontros sobre escritores contemporâneos que precisaram se exilar, tratando como o deslocamento molda, entre outros, a experiência de identidade, comunidade e linguagem. 

O ciclo inclui escritores de diferentes origens e destinos. A palestra inaugural, às 18h30, será com o escritor e cineasta afegão Atiq Rahimi, que se asilou na França em 1984, fugindo da guerra com a União Soviética. Vencedor do Goncourt, mais importante prêmio literário francês, por “Syngue Sabour: Pedra de paciência” (Estação Liberdade, 2009), Rahimi aborda em sua obra como as memórias de infância e o modo de ser persa comunicam-se e interagem com a cultura francesa em diferentes dimensões, incluindo a sexualidade e a língua.

As demais palestras serão com Terézia Mora (húngara radicada na Alemanha), Felix Kaputo (congolês exilado no Brasil) e os brasileiros Carola Saavedra e Julián Fuks, respectivamente de origem chilena e argentina, cujos pais fugiram das ditaduras em seus países.

A curadora do projeto, a professora de Literatura da PUC-Rio Clarisse Fukelman diz que a relação entre escrita e exílio forçado tem longa história — nomes como Victor Hugo, Vladimir Nabokov e Stephan Zweig, entre tantos outros, precisaram se refugiar. Seu interesse, contudo, foi em autores contemporâneos, devido à atual situação internacional. O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur) calcula que 65 milhões de pessoas precisaram migrar forçosamente em 2017 devido à perseguição, conflito, violência ou violações dos direitos humanos.

Para Fukelman, a particularidade da literatura em comparação com outros tipos de discurso como o acadêmico ou o factual é “uma abertura para a subjetividade, de um modo que não se pressupõe lógico ou racional”. A expressão literária, ela diz, permite “ativar a memória de um modo muito particular”, o que a diferencia de parâmetros “mais midiáticos e negativos, que seguem uma lógica do escândalo e do mercado”.

De acordo com Fukelman, a curadoria do ciclo procura se afastar de uma ideia de arte militante, como se os textos “se reduzissem à defesa de uma causa”. Os autores tampouco “têm uma visão autobiográfica umbilical, que só olha para si, como acontece com outras correntes literárias contemporâneas”, afirma.  

Se há algo que une os autores, diz a curadora, é “dar voz aqueles que não a têm, mas de modo que não seja nem um pouco proselitista, nem queira salvar a pátria de ninguém. Se a arte estiver a serviço de alguma bandeira, ela morre”. Ademais,  a condição exilada submete os escritores a um estado híbrido: tendo se afastado de sua antigas comunidades, os autores tampouco se integram a outras culturas “sem que haja choques”, acrescenta a pesquisadora. 

A segunda palestra acontece no dia 4 de julho, sobre o exílio na América Latina durante as recentes ditaduras no continente. Filho de argentinos nascido no Brasil, Julián Fuks ganhou em 2016 o Prêmio Jabuti por “A resistência” (Companhia das Letras), em que trata da experiência de “herdar o exílio”. 

Carola Saavedra, por sua vez, mudou-se para o Brasil aos três anos, em 1976, com os pais deixando o Chile por razões econômicas. “Com armas sonolentas” (Companhia das Letras), seu novo livro, será lançado no próximo dia 21 no Rio e aborda, diz ela, “o exílio geográfico e emocional”.

 No dia 15 de agosto, Felix Kaputu, autor congolês que já escreveu cinco livros acadêmicos e dois de ficção, fala sobre como a escrita interroga a globalização. Ele inaugurou a adesão do Brasil à International Citizens of Refugee Network (Icorn), rede idealizada por Salman Rushdie que aloca artistas em risco em lugares seguros. O acolhimento de Kaputu foi viabilizado pela ONG Casas Brasileiras em associação com a UFMG.  

Os pesquisadores e professores de Filosofia Cláudio Oliveira da Silva (UFF) e Marcos Gleizer (Uerj) fazem mesa teórica em 29 de agosto, propondo uma reflexão baseada em Espinosa e Giorgio Agamben. Finalmente, no dia 12 de setembro, a autora húngara Terézia Mora,  que se realocou em Berlim em 1990, faz palestra sobre como a ficção reinventa a alteridade e o estranhamento desencadeados pelo trânsito entre culturas.