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Pluripartidarismo exausto

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Antigos e mais recentes debates sobre a experiência brasileira com os partidos políticos não se revelam conclusivos em relação a vários aspectos, embora a maioria seja acessível a um detalhe fundamental; e sobre ele seria oportuno que as lideranças voltassem a refletir: se o bipartidarismo se mostra insuficiente, porque sempre tende a desempenhar papel plebiscitário, o pluripartidarismo, caracterizado pela abundância, leva a graves defeitos, como facilitar o tráfico de influência e a fragilização da governabilidade, fazendo ou não oposição ao Executivo. Não é outra coisa a que se tem assistido hoje.   

A retomada do tema teria pouco a acrescentar ou excluir desse painel, pois tivemos, ou ainda temos, acumulados exemplos das dificuldades com a escassez e a fartura das legendas. O pluripartidarismo dos nossos dias reclama urgente enxugamento. Dispensadas maiores argumentações, bastaria lembrar, apenas, que muitas das siglas em voga não resultaram de propostas políticas ou ideológicas, mas tão somente de dissidências internas, não superadas, de  grupos que antes figuravam entre os maiores. O choque de interesses logo se torna suficiente para que uma parte descontente se desligue, e vá bater à porta do Tribunal Superior Eleitoral. Nasce um novo partido, sob o batismo da legislação receptiva, pouco exigente quanto a valores mínimos para que se constitua nova organização partidária. Em rigor, não é preciso ter ideias; basta não tê-las. 

O resultado dessa permissividade são os penduricalhos da estrutura partidária brasileira, onde se debocha das muitas letrinhas improvisadas em que se transformou; as mesmas que, de tão batidas, começaram, mais recentemente, a ser substituídas por expressões. E só. Até quando chega o momento de disputar um pedaço do poder, o que facilmente se torna possível pela via das alianças, que, muitas vezes, nada mais são que concubinatos adulterinos. 

Observada a anatomia desses filhotes de casamentos fracassados, gerados na rebeldia que construíram em antigos domicílios, não se consegue identificar uma causa sadia, um ideal definido. Conseguem prosperar num imenso vácuo programático.  

Bastaria bater em retirada a proliferação e adotar o bipartidarismo? Certamente que não, pois sua passagem por caminho tão estreito não reserva boas lembranças, mesmo tendo sido razoavelmente útil no Segundo Império, para abrigar conservadores e liberais, mas sem permitir a Hermeto Carneiro Leão um último esforço pela conciliação, que poderia salvar o regime. O bipartidarismo voltaria a prestar relevante desserviço em 1964, quando de nada mais cuidou, além de agasalhar quem era contra ou a favor da ditadura, sem qualquer preocupação com um ideário legítimo. Nada acrescentou à democracia; pelo contrário, ajudou a esconder o caos do momento. Eis seu defeito medular, além de favorecer a prosperidade das oligarquias.    

Se dois de ontem foram pouco e os trinta de hoje demasiados, conclui-se ser mais que oportuno sair em busca de soluções que se inspirem nas experiências. O Congresso Nacional, nas poucas vezes em que o assunto entrou em tela, abordou sugestões para que a indesejada abundância seja reduzida para cinco ou seis partidos, capazes de representar, alternadamente, os pensamentos de centro, esquerda e direita, além de outros poucos que se propuserem a colher o que de melhor podem extrair das tendências de extremo. Longe de ser uma fórmula definitiva, estaria aí um ensaio na busca do melhor possível.