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Alianças em cova rasa

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Alianças partidárias, no Brasil de hoje, como no de outros tempos, jamais puderam ser acusadas de perenidade, pois quase sempre são criadas de acordo com conveniências do momento político. Esse, quando se esgota, ele próprio cuida de condenar os acordos à cova rasa, com sepultamento que se processa sem maiores sacrifícios, diante da carência de princípios programáticos ou ideológicos. Viram indigentes, enterro de segunda classe. As razões que levam à aproximação de duas legendas são, portanto, obra de mero oportunismo; e, exatamente por isso, também se torna fácil a sangria, tão logo desaparecem os interesses circunstanciais.

O histórico dessas alianças, assunto que excita alguns estudiosos da política nacional, destaca, sobre todos os demais detalhes de relevo, a capacidade que as acompanha de desmantelar-se com a mesma facilidade com que são arquitetadas. Ocorre logo à lembrança, tomados os casos mais recentes, as relações do Partido dos Trabalhadores com o então PMDB (hoje despido do P), juntos na campanha eleitoral de 2014, quando foram capazes de superar as dispepsias internas, porque, para ambos, naquela hora, o que convinha era derrotar os tucanos e a candidatura de Aécio Neves.

A tolerância rapidamente desmoronou, quando o vice emedebista Michel Temer assumiu a cadeira do PT, deixada vaga com o impedimento da presidente petista. Pronto! De momento para outro, os velhos companheiros tornaram-se adversários figadais. O que ajuda a compreender que a aproximação entre os dois principais partidos do país resultara apenas de uma conveniência eleitoral, nada de substância. E hoje, parece, sem volta à amizade rompida, pois como prolatava nos sertões o velho Coronel Severino, aliança partidária é como casamento e leite: depois que azeda não ferve mais.

Se cuidamos de somar algumas particularidades regionais, preservados os altos interesses da direção nacional dos partidos, esse modus vivendi, não diferentemente, assemelha-se a certos organismos da natureza, que nascem para vida curta e com tempo definido para morrer. Nem discrepa o que ocorre atualmente em Minas, onde se opera visível conflagração dos antigos aliancistas, quase chegando à raia da intolerância, até com possibilidade de gerar idêntica situação no resto do país, porque a política mineira insinua-se, e sempre teve uma certa competência para exercer capilaridade. Lá é o MDB contra o PT; em Brasília, o PT contra o MDB. Sem diferenças, porque, também na essência da política, a ordem dos fatores não altera o produto. O presidente Temer, ao embargar a renovação do antigo acordo estadual, desfavorecendo o governador petista, manifesta-se simpático à candidatura própria de seu partido, e pode estar pagando, com a mesma moeda, as hostilidades que tem sofrido.

Analisados com alguma profundidade, sem maiores pretensões de dar o assunto por vencido, tem-se como certo que os projetos comuns que uma ou mais legendas levam ao eleitorado começam por pecar é na heterogeneidade dos princípios, deixados de lado no momento dos grandes acertos. É o suficiente para decretar graves fragilidades, expostas ao primeiro sinal de divergência. Relações que se tornam ainda mais raquíticas, se em torno delas gravitam os 35 partidos registrados no Tribunal Superior Eleitoral. Gravidade mais frequente em ano eleitoral, quando não faltam absurdos na convivência partidária baseada apenas na negociação de breves e valiosos segundos de propaganda política na televisão. Cessam os segundos, cessam as alianças.

A legislação eleitoral andaria bem se estabelecesse regras básicas, menos pragmáticas, para dar sua bênção a esses acertos ocasionais.