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Pessoas que tiveram voos cancelados por conta da Copa podem entrar na Justiça

Advogado garante que quem se sentir prejudicado com restrição de voos pode recorrer legalmente

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Em março deste ano, o Comando de Defesa Aeroespacial Brasileiro (Comdabra) e o Centro de Gerenciamento de Navegação Aérea (CGNA) – ambos órgãos da Aeronáutica – divulgaram informações sobre a restrição de voos em todas as 12 cidades-sede do jogos da Copa do Mundo 2014 em dias de jogos. Por conta da medida, mais de 800 voos que passam por um raio de até sete quilômetros ao redor dos estádios onde acontecerão as partidas foram cancelados. Agora, faltando dois dias para o início do Mundial de futebol, cerca de 16 mil pessoas que tiveram as passagens canceladas ou remanejadas vão sentir efetivamente os impactos da medida de segurança.

A medida em questão vai provocar ainda o fechamento para pousos em oito aeroportos do Rio, Belo Horizonte, Salvador, Fortaleza, Recife, Cuiabá, Manaus e Curitiba. Decolagens também estarão restritas e devem ter seus horários alterados. Nessas capitais, apenas aeronaves militares terão permissão, em situações excepcionais, para vôo em áreas restritas.

De acordo com a Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), o número de vôos alterados corresponde a menos de 1% dos voos do período. Sobre as medidas, a Abear explica que durante o momento de realização de uma partida será criada uma zona virtual de proteção em torno dos estádios. São definidos raios que tem como centro o estádio que tem a partida e divididos três zonas, ativadas de acordo com a natureza da partida. A zona mais restrita teria um raio de quatro milhas, a segunda teria  sete milhas e a área seguinte não tem raio definido.

A Abear faz questão de frisar ainda que as medidas seguem uma programação de natureza de defesa, definida pela Aeronáutica. Em relação aos horários, durante a partida da abertura dos jogos, por exemplo, a zona de restrição será ativada três horas antes da partida e será mantida por até quatro horas após o término dela.

Vice-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o advogado Ronaldo Cramer acredita que o tratamento que a situação está recebendo é exagerado. “Eles imaginam que vai acontecer algum tipo de ataque aéreo? É de uma imaginação hollywoodiana. E ainda fica a questão de se fechar o espaço aéreo realmente seria suficiente para evitar isso. Enfim, é extremamente exagerado”, pontua.

O caso das passagens não é a única interferência direta na vida dos brasileiros por conta da Copa do Mundo. Com as medidas da Lei Geral da Copa, a Fifa está autorizada, entre várias outras coisas, a definir áreas de restrição comercial em até dois quilômetros ao redor dos estádios. Além disso, artigos que proibiam o serviço voluntário em atividades que colocassem em risco a segurança e o bem-estar do público foram vetados.

Para o Cramer, as pessoas que se sentirem prejudicadas devem buscar uma indenização contra a companhia aérea responsável pelo voo cancelado ou remanejado e contra o Estado, que estaria permitindo a interferência direta da Fifa no cotidiano da população brasileira. “Várias dessas interferências são desmedidas e desnecessárias. É como se estivéssemos vivendo em um Estado à parte durante a execução da Copa. A Fifa não pode ter esse controle”, diz o advogado.

A assessoria da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) informou que, caso o passageiro se sinta prejudicado ou tenha seus direitos desrespeitados, deve procurar a empresa aérea contratada para reivindicar seus direitos como consumidor. Se as tentativas de solução do problema pela empresa não apresentarem resultado, o usuário poderá encaminhar a demanda a Anac, aos órgãos de defesa do consumidor e ao Poder Judiciário.

De acordo com a assessoria da Autarquia de Proteção do Consumidor (Procon), os casos que envolvam diretamente a Lei Geral da Copa estariam fora da possibilidade de intervenção do órgão. Contudo, como os  cancelamentos e remanejamentos de vôos foram uma resolução da Anac, o funcionamento do serviço de proteção ao consumidor permanece normal. O consumidor poderá, após formalizar a reclamação na Anac, buscar auxílio junto ao Procon.

Contudo, a Abear diz que não acredita haver motivos para passageiros insatisfeitos reclamarem junto ao Procon. De acordo com a assessoria da Associação, se tratam de casos de cancelamentos de voo que não ocorreram nem por vontade do passageiro, nem por vontade da companhia. Todos os passageiros já teriam sido comunicados e realocados em outro voos ou feito o pedido de reembolso.

Apesar disso, Ronaldo Cramer acredita que um ressarcimento do valor pago na passagem nunca vai reparar integralmente o dano. “Tem a questão do transtorno, a pessoa não vai poder seguir com sua programação normal de vida. Essa pessoa tem como entrar na Justiça, contra a companhia aérea, contra o Estado ou contra os dois, dependendo da estratégia processual”, explica.

Apesar de os órgãos oficiais garantirem que a situação dos cancelamentos está sob controle e que não representam um problema, casos de pessoas que passaram por transtornos para efetivar a troca dos bilhetes já foram notificados na mídia. O advogado Cramer diz que é uma situação de irresponsabilidade das empresas de voo também. “Venderam passagens para depois revogar. Se eles alegam estar seguindo um protocolo padrão, por que venderam as passagens? Má fé ou desorganização, essa situação toda é um erro”, afirma.

Obrigações das empresas aéreas

De acordo com a Anac, nos casos de cancelamento programado de voo, as companhias aéreas devem acomodar o passageiro em voo próprio a ser realizado em data e horário de conveniência do usuário. Caso o voo ofertado não atenda as necessidades do passageiro, a empresa deve prover o reembolso de acordo com a forma de pagamento utilizada na compra da passagem. As providências para o reembolso devem ser imediatas.

Além disso, nos casos de atraso, cancelamento ou interrupção de voo, bem como de preterição de passageiro, o transportador deverá assegurar ao passageiro o direito a receber assistência material, tais como direito à comunicação, a partir de uma hora de atraso; de alimentação, a partir de duas horas de atraso; e de acomodação, a partir de quatro horas de atraso. Independentemente do motivo, a Anac afirma que a resolução deve ser cumprida em todo território nacional por todas as companhias brasileiras e estrangeiras que operam no país.