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Temer agoniza

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A divulgação tanto da gravação da conversa entre o megaempresário Joesley Batista e o presidente Temer quanto dos vídeos com as delações dos executivos da JBS, multinacional brasileira e maior produtora e exportadora de proteína animal do mundo, caiu como bomba atômica sobre o governo federal. O STF autorizou o inquérito investigativo contra o presidente por obstrução da justiça, corrupção e formação de organização criminosa, solicitado pela Procuradoria-Geral da República.  O Conselho da OAB pedirá impeachment de Temer por crime de responsabilidade e oito pedidos com o mesmo teor foram protocolados na Secretaria-Geral da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados. A possibilidade de outra deposição presidencial retorna à cena política da dramática crise nacional, quando a economia ainda sequer saiu da UTI.

Se até a semana passada o presidente lograva organizar a governabilidade, por manter uma forte base de apoio no Congresso, mas era desprovido de legitimidade – devido à esmagadora rejeição da opinião pública às suas políticas e também, em alguma medida, ao modo como chegou à chefia do Executivo –, após os fatos recentes, sua sustentação partidária, na grande mídia e no próprio mercado financeiro passou a desmoronar. Sua coalizão institucional e social corrói-se, mas prossegue em pé a demanda pela continuidade das reformas trabalhista e previdenciária por parte do poder econômico.

A reação de Temer, que, em pronunciamento ao público, atacou a gravação e o empresário e alegou ter sido vítima de uma conspiração, além de recorrer ao STF pedindo perícia no áudio, que considera ser fraudado, e engavetamento do inquérito, não parece ter surtido efeito político efetivo, ao menos até o momento. Tampouco dá para desenhar um prognóstico que lhe seja favorável. Pelo contrário, sua perda de legitimidade parece ter ingressado em uma espiral irreversível. Em todo o caso, o pleno do STF apreciará na quarta-feira o pedido da defesa de Temer de suspensão do inquérito até a conclusão da perícia solicitada e já acatada por Fachin.

Um outro capítulo da inacreditável crise nacional se abriu no rastro das investigações contra a corrupção. Se, até então, a repercussão na classe política das irregularidades envolvendo as empresas (Petrobras e grandes empreiteiras) atingiam, em primeiro lugar, o PT e seus dirigentes, a começar por Lula, as informações provenientes da JBS pegam em cheio o PMDB de Temer e o PSDB, através de seu presidente, o senador Aécio Neves, que foi afastado das funções pelo ministro Edson Fachin (relator da Lava Jato) e da presidência do PSDB pela cúpula tucana, além de sua irmã, Andrea Neves, ter sido presa. O senador José Serra (PSDB-SP) também foi mencionado na delação da JBS. Assim, os dois principais partidos de sustentação do atual governo, PMDB e PSDB, estão na linha de fogo da crise política. O PPS e o PSB decidiram romper com Temer e entregar seus cargos ministeriais. Eles possuem, respectivamente, 9 e 35 deputados. O PSDB, que possui 47 deputados, rachou sobre sua saída do governo e passou a condicionar seu apoio à continuidade das reformas

Especula-se que Temer poderá renunciar se o inquérito prosseguir. Aumentou muito também a chance de que a chapa Dilma-Temer seja cassada pelo TSE, no julgamento agendado para 6 de junho. Em caso de queda do presidente, a solução constitucional formal é a eleição indireta. Alguns nomes vêm sendo mencionados para preencher essa possibilidade, como Henrique Meirelles, Carmem Lucia, Nelson Jobim, Tasso Jereissati e Fernando Henrique Cardoso.

Por outro lado, há também na Câmara a proposta de emenda constitucional do deputado Miro Teixeira (Rede-RJ), que prevê eleição direta em caso de vacância presidencial. Considerando a regressão institucional da ordem jurídico-política da República Federativa do Brasil tanto em relação ao Estado da Lei quanto na dimensão democrática, devido ao impedimento sem claro crime de responsabilidade, uma volta ao princípio da soberania popular, através do voto, parece ser a única luz no fim do túnel.

Levando em conta a indispensabilidade da existência consistente do Estado Democrático de Direito como fator de estabilidade política, a alternativa das eleições gerais é a melhor, pois o atalho que enveredou na rota atual, caracterizada por comprometimentos em relação aos direitos civis e à regra da maioria, abriu a fratura imensa configurada na lamentável crise em curso desde 2015, que devora os sistemas político e econômico. Diretas Já, no âmbito de um pacto de salvação nacional! 

* Marcus Ianoni é cientista político, professor do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal Fluminense (UFF), realizou estágio de pós-doutorado na Universidade de Oxford e estuda as relações entre Política e Economia