ASSINE
search button

Basta de más notícias

Compartilhar

Hoje vou dar uma pausa aos meus fieis leitores, não comentando nenhuma das mazelas, dentre tantas, que acontecem no trânsito do Rio. Já basta o noticiário da grande mídia e dos jornais televisivos, ao noticiarem as reações de taxistas, a queda de braço da Rio Ônibus, na justiça, contra a Secretaria Municipal de Transportes. Vamos viajar, no bom sentido e não no figurado. Vamos até a “velha e querida Londres”, na definição de Ernest Hemingway, de onde nos vem a noticia de que, a longo prazo, pretendem eliminar a poluição dos gases provocados pela utilização, pelos veículos que por lá circulam, de combustíveis oriundos de fosseis. Somente circularão na capital do Reino Unido veículos movidos  por motores elétricos. Com que alegria e orgulho recebi esta noticia. Eu, um anglófilo fanático.

Tornei-me assim graças ao meu tempo de vida feliz no serviço ativo da Marinha do Brasil. Com apenas 23 anos, no posto de Guarda Marinha, tive a felicidade de permanecer em território inglês por quase cinco meses, e tal fato marcou a mim e meus colegas de turma para sempre em nossos hábitos de proceder e até de nos vestirmos. Foi em 1950, Londres ainda apresentava as terríveis cicatrizes da blitz alemã e enfrentava um rigoroso racionamento de víveres, a fim de economizarem e poderem pagar as dívidas de uma guerra que haviam vencido.

Já naquela época, chamou-me a atenção a ordem de seu trânsito, a eficiência de seu “Underground”, iniciado em 1861, a postura de seu policiamento de trânsito, com os famosos  “bobys’, verdadeiros maestros regendo as correntes de tráfego que eu, quase trinta anos depois, tentaria aplicar ao nosso policiamento de trânsito, com os famosos “Luvas brancas”, soldados da PM treinados no Corpo de Fuzileiros Navais.

No fatídico dia 16 de julho daquele  ano, quando perdemos a Copa do Mundo  para a brilhante seleção uruguaia, ao perguntar alguma dúvida a um policial, em plena Picadilly Circus, tomei conhecimento do fino humor inglês quando, por eu estar fardado, ao me perguntar de onde eu vinha, respondendo eu ser brasileiro, arrematou, com um sorriso matreiro: “Ah, quase campeão do mundo?”

Ainda na Marinha regressaria a Londres, rapidamente, em fevereiro de 1964. Limitei-me, já como Capitão de Corveta, a cumprir a agenda de visitas e almoços, não só em Londres mas em Portsmouth. Aprendi o esnobismo inglês ao ser convidado, num almoço numa fragata, pelo meu imediato para sentar-me ao seu lado. Ao observar que eu não era o oficial mais antigo, retrucou: “Não importa, você fala um bom inglês.” É, eles são assim. Por isso estão deixando a União Europeia.

Como autoridade de trânsito ou fora de função pública, sempre que pude regressei à “minha” Londres a fim de aperfeiçoar-me  na ciência do controle do trânsito. Numa destas visitas, em 1976, sendo eu Diretor de Trânsito, quando acertara aqui no Rio com o Consulado Inglês visitas às instalações de trânsito de Londres, visitei o Road Research Laboratory, o maior centro de pesquisas de trânsito do mundo, e conheci pessoalmente Sir George Charlesworth, seu diretor, segunda pessoa do transporte da Inglaterra que estivera no Rio em 1954, a serviço da ONU, quando apresentou notável relatório sobre o trânsito de nossa cidade. Também tomei conhecimento, na central de trânsito de Westminster, do sistema de controle de semáforos, SCOOT (Split Cycle Offset Optmisation Technique), da Plessey, capaz de controlar os semáforos, comandado pelas informações dos reais perfis de tráfego, com o atraso de apenas cinco segundos.

Já no século XXI, tomei conhecimento do sistema de “congestion charging”, capaz de controlar o volume de tráfego de carros, no centro de Londres,  implantado pelo prefeito Ken Livingstone. Baseado, neste seu sistema, desenvolvi o meu URV, capaz de reduzir o volume de carros nas horas de pico em até 80%, além de fornecer recursos para o transporte de ônibus ser gratuito. Infelizmente, pelo rigor de suas medidas, de racionamento do uso das vias, não é aceito pela covardia política de quem poderia implanta-lo.

Mas o maior ensinamento para a vida, agora que vivo a terceira avançada idade, aprendi com um feliz encontro com o grande ator David Niven, a mim propiciado num  restaurante londrino por um alto funcionário do departamento de trânsito de Londres. Não perdendo a oportunidade, o famoso  ator, ao ouvir de mim o elogio pela sua aparência física, apesar de sua avançada idade, retrucou com esta magnífica piada: “Nem tanto, meu caro. Outro dia, em  New York, uma senhora não se conteve e me perguntou: O senhor não foi o David Niven?”

Graças a este feliz encontro, hoje, quando já emplaquei noventa anos e me perguntam se eu não sou o Celso Franco, repondo, tranquilamente: Fui.