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COISAS DA POLÍTICA

Bolsonaro, presidente 100%: em sigilo e em impunidade?

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Publicado em 31/07/2022 às 09:06

Alterado em 31/07/2022 às 09:23

A Polícia Federal avaliou que a presença de apoiadores do ex-capitão gritando "mito, mito" atrapalharia o fluxo normal de passageiros do 2º maior aeroporto do país Foto: reprodução

Numa noite de 6ª feira, o colunista Zózimo Barroso do Amaral deparou-se com um súbito espaço reservado pelo diagramador (o profissional que faz o desenho gráfico dos espaços editoriais nos jornais e nos sites) para fechar sua coluna no JORNAL DO BRASIL. Na falta de um assunto mais quente, saiu-se com sua habitual finesse; a nota tinha o seguinte título (destacado em negrito pelo diagramador): Não será surpresa... e o texto delicioso, feito para deixar o leitor com a pulga atrás da orelha, dizia laconicamente: Não será surpresa para esta coluna... Na linha seguinte, emendava: Aliás, pensando bem, nada mais será surpresa para esta coluna... A nota, uma divagação sobre o nada, mas um show de criatividade, um drible no lenço, para preencher o vazio, deixou os leitores encafifados no dia seguinte, esperando o grande furo que a coluna iria dar (Zózimo sempre dava um furo na política, na economia e na vida social). De certa forma me lembrei, com saudade, desses tempos, não só pela partida da sempre elegante e divertida colunista Anna Ramalho, que nos deixou esta semana, mas pela malandragem dos asseclas e apoiadores do presidente Jair Bolsonaro, que ousam preparar a blindagem de sua pessoa em caso de derrota para Lula com a esdrúxula proposta de criar um Projeto de Emenda Constitucional (PEC) para outorgar, compulsoriamente aos ex-presidentes da República, o cargo de senador vitalício da República.

Não ria, caro leitor. Não seria surpresa para este colunista se isso vier a acontecer. É que, depois que tudo foi banalizado neste desgoverno Bolsonaro, quando qualquer motivo é pretexto para uma proposta de Emenda à Constituição, a ideia pode prosperar para livrar Bolsonaro (e quem sabe os amigos e familiares) dos rigores da lei (há 146 pedidos de “impeachment” arquivados ou engavetados pelos presidentes da Câmara e do Senado Federal). As constituições retratam um tempo, uma época. Assim, fora as questões declaradas 'cláusulas pétreas', ou imexíveis, PECs podem ser aprovadas com maioria constitucional, ou seja, com 3/5 dos votos na Câmara dos Deputados (como são 513 representantes, por 60% dos deputados mais um - 308 votos); e, em uma 2ª rodada, no Senado, por 49 votos dos 81 senadores. Diante das ritos sumários adotados pelo presidente da Câmara, o deputado Arthur Lira (PP-AL), o mais fiel escudeiro de Jair Bolsonaro, que passou a adotar votações por celular (com os parlamentares em outros estados ou fora do Brasil, para alterar as letras da Carta Constitucional), nada mais será surpresa. Até o golpe.

Em três anos e sete meses do governo Bolsonaro já foram aprovadas 26 emendas à Constituição, sendo 11 este ano, antes do recesso parlamentar em 15 de julho. O recorde anterior foi do 2º governo de Fernando Henrique Cardoso (1999 a 2002), que teve de mudar o regime fiscal, após a desvalorização do real, em janeiro de 1999, e precisou criar a Lei de Responsabilidade Fiscal para amarrar os gastos públicos. Dilma conseguiu 14 emendas no 1º governo (2011-2014).

Donga compôs há mais de um século (1917) o que seria o primeiro samba, “Pelo Telefone”. O sempre antenado e agora imortal Gilberto Gil lançou, 80 anos depois, a atualização do “Pelo Telefone”, rebatizado de “Pela Internet”. Pois Arthur Lira criou o “Pelo Celular”, com a franquia livre às emendas da Constituição. Quem sabe não pretende criar uma PEC para aprovar o voto em outubro pelo celular. A questão é que o Congresso retoma as atividades dia 1º de agosto e tudo será possível, com o rolo compressor da maioria do Centrão e o poder de $edução das emendas secretas. Foi assim que se atropelaram a Constituição, a LRF, o teto de gastos e a Legislação Eleitoral, que proíbe a criação de benefícios ao eleitor em ano eleitoral (para comprar simpatia).

Como a última pesquisa DataFolha - realizada dias 27 e 28 de julho, já com o pacote de R$ 41,2 bilhões das bondades eleitorais para milhões de eleitores até dezembro, conhecido de boa parte dos consultados - mostrou Lula com os mesmos 47% das intenções de voto da pesquisa de junho e Bolsonaro só avançou de 28% para 29%, podendo a fatura ser decidida no 1º turno, as articulações no Congresso para a viabilização da malfadada PEC devem tomar corpo esta semana. Mas Bolsonaro, com o reforço dos R$ 32,1 bilhões de dividendos da Petrobras, cuja parte do lucro de R$ 54,330 bilhões, divulgado na 5ª feira, 28 de julho, pretende aliciar os eleitores pelo bolso, com a distribuição do novo Auxílio Brasil de R$ 600, a partir de 9 de agosto, juntamente com o vale-gás. Na semana seguinte começa a distribuição do vale caminhoneiro de R$ 1 mil mensais a quase 900 mil motoristas autônomos. Antes do fim de agosto, será a vez da mesada pingar no bolso dos taxistas. O pacote é a esperança de mudar o jogo com a ajuda da Petrobras, cujo lucro já não foi demonizado, nem taxado de “estupro”, como os R$ 43,569 bilhões registrados no 1º trimestre, ao serem divulgados em maio, em seguida a um reajuste para cima dos combustíveis. Desta vez, a Petrobras, sob o jugo do 5º presidente indicado pelo governo Bolsonaro, reduziu o preço da gasolina pela 2ª vez nas refinarias em 9 dias. O que antes era “problema”, virou solução.

A força da Democracia

Ainda bem que a Democracia falará mais alto (ecoando o bom senso) no dia 11 de agosto, com a grande manifestação na Faculdade de Direito de São Paulo. A leitura da “Carta às brasileiras e aos brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito”, que nos próximos 10 dias deve dobrar o número de assinaturas, para um milhão de cidadãos, até o dia 11. O manifesto será uma comemoração pelo lançamento de movimento ainda mais corajoso, no mesmo pátio, em 1977. No ritmo de “stop and go” do processo de abertura, lenta, segura e gradual, para contentar os setores mais radicais dos militares (em janeiro de 1976, o presidente demitira o general Ednardo D’Àvila Mello do comando do II Exército, em São Paulo, após as mortes, nas prisões do DOI-Codi, do jornalista Vladimir Herzog, e do operário Manoel Fiel Filho, o que gerou reação da tigrada), Geisel fechou o Congresso Nacional em 1º de abril, cassou alguns políticos, entre os quais o senador Alencar Furtado (MDB-PR) e em 13 de abril baixou o Pacote de Abril, com a volta da censura e a aplicação da “Lei Falcão” na campanha eleitoral, com a breve liberdade de discursos nas campanhas do rádio e TV em 1974, quando havia só dois partidos - a Arena, da situação e o MDB - mesmo com poucos minutos, a oposição elegeu 16 dos 22 senadores, como Orestes Quércia (SP), Saturnino Braga (RJ), Paulo Brossard (RS), Itamar Franco (MG) e Marcos Freire (PE). Na Câmara, a oposição conquistou 44% das cadeiras, ameaçando a hegemonia do governo militar na eleição do sucessor por via indireta no Colégio Eleitoral (composto pelos deputados e senadores e alguns prefeitos). Em 1976, houve novo avanço da oposição nas eleições municipais, embora os prefeitos das grandes capitais continuassem a ser indicados e não votados pelos eleitores.

A ameaça nas eleições de 1978 era real. Então, numa guinada radical, a “Lei Falcão” (inspirada pelo então ministro da Justiça, Armando Falcão) proíbe a fala dos candidatos: em seu lugar apenas o retrato e uma breve biografia do candidato. Mas o golpe final para o governo se recuperar do revés de 16 a 8 na eleição de 1974 para o Senado foi a criação da figura do “senador biônico”, um 3º senador por estado, que não seria eleito pelas urnas, mas indicado pelo governo. Na época eram 22 estados (vários territórios não tinham eleição). A indicação de um senador para cada estado garantiu a maioria folgada ao governo. O desmembramento em dois do Mato Grosso, com a criação do estado do Mato Grosso do Sul, ainda em 1977 (com um senador biônico e dois eleitos), ampliou a maioria. Mas as intervenções não serviram para baixar as pressões dos radicais da ultradireita, que em agosto de 1977 lançaram a candidatura do ministro do Exército, general Sylvio Frota (Geisel preferia o general João Batista Figueiredo, que comandava o SNI e foi o escolhido em 1978). Com a resistência de Frota, que tentou sublevar uma parte do Exército, o presidente da República monta uma operação de Estado Maior, convoca todos os generais de Exército a Brasília (para conferir quem seria fiel ao governo e quem iria aderir ao ministro do Exército), e demite Sylvio Frota. Um dos ajudantes de ordens do ministro era o atual general da reserva Augusto Heleno, que comanda o Gabinete de Segurança Institucional de Bolsonaro.

Conselho não se dá de graça

Pelo sim pelo não, já garantindo uma porta de saída, sob o pretexto de que todos os ex-presidentes ainda vivos seriam beneficiados - José Sarney, sem mandato parlamentar e imortal da Academia Brasileira de Letras, tem 92 anos, um a mais que Fernando Henrique Cardoso, Michel Temer está com 81 anos, Luís Inácio Lula da Silva completará 77 anos em 27 de outubro, Dilma Roussef tem 74 anos e Fernando Collor de Mello completou 73 anos - a emenda quer mesmo é blindar Bolsonaro do alcance de ações judiciais por crimes de responsabilidade, como os da Covid-19 e os escândalos do Ministério da Educação. Ele já está parcialmente blindado quanto ao levantamento de provas contra seus atos e de seus parentes, com o sigilo de 100 anos (!) para vários de seus atos e inquéritos, como os das “rachadinhas” dos salários de apaniguados em seus gabinetes no antigo mandato de deputado federal e no mandato do filho 01, o atual senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), quando era deputado estadual na Alerj. O general Heleno, do GSI, sempre encontra motivo de segurança nacional para impor sigilo a questões investigadas pela imprensa. Até a reunião convocada pela Presidência da República com embaixadores no Palácio da Alvorada, para Bolsonaro desancar o voto eletrônico no Brasil, seria enquadrada no sigilo de 100 anos. Se Jair Messias Bolsonaro deixar o cargo de presidente em 1º de janeiro de 2023, quando o calendário eleitoral prevê a posse do novo presidente, perderia o direito à imunidade. Deputado ou senador também só pode ser investigado, sob o mandato, se a Câmara ou o Senado aprovarem. O espírito de autoproteção fala mais alto e raramente o Congresso dá licença. Uma Flordelis é exceção que confirma a regra. Para cada Flordelis, há muitos deputados Daniel Silveira (PTB-RJ) ou senadores Chico Rodrigues (União Brasil-RR) livres na Praça dos Três Poderes.

Enquanto estiver investido do mandato, a Constituição reza que o presidente da República não pode ser investigado (embora possa sofrer processo de “impeachment” por votação na Câmara). Com Arthur Lira, Jair Bolsonaro está blindado. Sem a faixa presidencial, ex-presidente vira um cidadão comum e poderia ser imediatamente acionado na Justiça Comum. Com um mandato de senador, estaria sujeito ao foro especial dos tribunais superiores (Superior Tribunal de Justiça ou Supremo Tribunal Federal). Na Justiça comum, processos podem durar uma eternidade, pois o STF voltou atrás e condenação em 2ª instância não mais motiva prisão ou sentença final nos tribunais superiores. No foro especial (STJ ou STF), o julgamento é cercado de sigilo (na 1ª e 2ª instância o vazamento é mais corriqueiro). Assim, haveria menos achincalhe contra um ex-presidente, a principal preocupação de Bolsonaro.

O caso é que a proposta, além de esdrúxula e casuística, esbarra numa questão prática e preliminar: qual seria o prazo da vigência do mandato? Já que o ano legislativo começa em 1º de fevereiro, se acompanhar o mandato dos senadores eleitos e reeleitos em 2 de outubro próximo, o ex-presidente (e os demais que, por acaso, viessem a ser processados) ficaria sem foro especial em janeiro. A história das civilizações gregas e romanas, que deram forma inicial à figura do Senado, formatada no Império Romano, foi de reunir a experiência dos anciãos e homens públicos mais sábios num conselho consultivo da República. José Sarney ensaiou essa ideia antes de encerrar o governo, com medo de ser preso. Na primeira eleição, em 1994, buscou a imunidade do mandato popular. Mas em vez do Maranhão, sua terra natal e reduto político, com o temor da derrota, foi buscar uma obscura candidatura a senador pelo Amapá. Os funcionários de uma empreiteira amiga que atuou como cabo eleitoral garantiram metade dos votos (equivalentes ao mínimo exigido para a eleição de um vereador em São Luiz, capital do seu estado). Eleito, operou para ser presidente “por aclamação” do Senado. Conseguiu, por duas legislaturas. Desgastado, e sem espaço político no Amapá e no Maranhão, desistiu de se lançar às urnas em 2014. Mas segue sendo um conselheiro político. FHC e Michel Temer também atuam nos bastidores da política. Dilma se afastou da militância após o “impeachment” e a derrota na eleição para o senado em Minas Gerais, em 2018. Voltou a circular com o crescimento da candidatura de Lula. Collor, que renunciou tão logo instaurado o processo de “impeachment”, em fins de 1992, perdeu os direitos políticos por oito anos. Eleito, em 2006, senador por Alagoas (2007-2015), estado que governou antes de se lançar à Presidência, na metade do 2º mandato de senador (2015-2023), está concorrendo novamente ao governo do estado.

Mas aqui para nós, num Congresso que nivelou por baixo o naipe de deputados e senadores, alguém se disporia a ouvir os “sábios” conselhos de Collor, Dilma, Temer, FHC, Lula ou Bolsonaro, caso nenhum deles vença nas urnas e precise ser abrigado na Câmara Alta do Parlamento brasileiro?

Jogando para a torcida

A bajulação dos políticos às grandes torcidas não é novidade na vida brasileira. Na República Velha, as mulheres que hoje representam mais de 52% da população do país só foram conquistar o direito ao voto em 1932, quando, no governo Getúlio Vargas, foi criada a Justiça Eleitoral. O maior estádio do Rio de Janeiro - maior cidade do país até 1953, quando é superado pela população de São Paulo - era o do Fluminense Football Club, nas Laranjeiras. As fotos dos jogos de futebol da época eram bem elitistas e machistas. Raramente se vê uma mulher nas imagens dominadas por homens de chapéu, terno e gravata. E o futebol tinha como rival de público as regatas (origem de três dos grandes clubes cariocas: Flamengo, Botafogo e Vasco da Gama). Quando o Vasco, 1º clube a profissionalizar os negros no futebol, construiu e inaugurou São Januário, em 1927, no governo de Washington Luiz (nascido em Macaé e que fora presidente da Província de São Paulo), com capacidade para abrigar até 25 mil torcedores, começou uma lenta democratização no futebol, que passou a arrastar multidões mais variadas ao estádio, onde se chegava de bonde.

Arguto, Getúlio Vargas não perdeu tempo. No Estado Novo, ainda com a prevalência do terno e gravata, usou e abusou dos eventos públicos para arrastar multidões de trabalhadores ao estádio e começar a retirar a pompa e circunstância dos jogos de futebol, precedidos pela execução do Hino Nacional. A celebração do 1º de maio era a apoteose de Gegê. Quando voltou ao poder, eleito pelo voto direto, as cerimônias em São Januário já estavam esvaziadas pela criação do Maracanã para a Copa do Mundo de 1950. A derrota para o Uruguai na final deixou o velho Maraca estigmatizado até pelos políticos. Com a conquista da primeira Copa do Mundo, em 1958, tudo foi esquecido. JK voltou aos estádios. Nos governos militares, o general Médici, que torcia pelo Grêmio no Rio Grande do Sul, e dizia torcer pelo Flamengo no Rio, cansou de frequentar o estádio para pegar carona na popularidade do tricampeonato no México. Embora tivesse se empenhado para a Embratel (então estatal) interligar as capitais do país, o que gerou a popularidade das novelas, grande trunfo da Rede Globo, e facilitou que ele próprio assistisse jogos do Grêmio, Flamengo ou da seleção em Brasília, Médici explorou o uso do radinho de pilha para ter empatia popular. Geisel era austero (jogava vôlei na praia do Leblon, quando jovem oficial) e raramente ia aos estádios, assim como o general João Figueiredo, que preferia os cavalos, que montava (já o marechal Costa e Silva, viciado em jogos diversos, gostava mesmo era de apostar em cavalos).

Após a redemocratização do país, José Sarney evitava comparecer aos estádios para não ser vaiado. Fernando Collor de Mello, que usou a presidência do CSA (de Alagoas), que assumiu em 1973, com 24 anos, para alavancar sua carreira política, seguindo os passos do pai, senador Arnon de Mello, começou a se afastar prudentemente dos estádios com a insatisfação popular gerada pelo confisco das aplicações financeiras. Seu vice, Itamar Franco, que ficou popular com o Plano Real engendrado pela equipe do seu ex-ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, até que ensaiou idas aos estádios. Já FHC, nunca foi de ceder a estes gestos populistas. De origem operária, peladeiro nas horas vagas e corintiano confesso, Lula transitou com naturalidade nos estádios. Antes de deixar o 2º mandato, em maio à imensa carteira de obras públicas contratadas pelo governo federal e as estatais, Lula aproveitou o aniversário do Corinthians, em maio de 2010, para obter do então presidente da maior empreiteira do país, a Odebrecht, o seu amigo Emílio Odebrecht, o compromisso de construir o estádio próprio do Timão em Itaquera, para servir de sede paulista aos jogos da Copa do Mundo em 2014 (o padrão-Fifa não homologara o estádio do Morumbi, do São Paulo). Lula conquistou de vez o coração dos eleitores corintianos, que estavam com baixa autoestima ante tricolores e palmeirenses, que construíam suas próprias arenas. Para viabilizar o estádio, os bancos estatais financiaram a expansão do metrô até o bairro de Itaquera, e a Petrobras mudou o traço de oleodutos e gasodutos.

Como se sabe, a construção dos estádios (ampliados de oito para 12 sedes, incluída a reforma do Maracanã, que de novo não celebrou triunfo brasileiro, com a hecatombe da derrota de 7 a 1 para a Alemanha, no Mineirão) serviu para facilitar costuras políticas de apoio à eleição de Dilma Roussef, em 2010. A empreitada gerou muita corrupção no superfaturamento de obras e legou pelo menos cinco elefantes-brancos: as arenas da Amazônia (Manaus), Pernambuco (Recife), o Mané Garrincha (Brasília), a Arena Pantanal (Cuiabá-MT), e a Arena das Dunas (Natal-RN).

Palmeiras, Fogão ou Mengão?

Bolsonaro é torcedor confesso do Palmeiras, em São Paulo. No Rio é Botafogo, e seu filho 01, o senador Flávio Bolsonaro, vascaíno. Mas Bolsonaro não se cansa de fazer afagos ao Flamengo, não só o clube de maior torcida no Rio de Janeiro, como o mais popular em todo o Brasil (o Corinthians é o 2º). Ele está tentando alavancar simpatias ao firmar aliança político-administrativa com o presidente do Clube de Regatas Flamengo, Rodolfo Landim. No 1º trimestre, tentou emplacar Landim, ex-funcionário da Petrobras e empresário do ramo de petróleo e gás, na presidência do Conselho de Administração da companhia, controlada pela União, em dobradinha com o consultor Adriano Pires. Ambos foram vetados, por conflitos de interesses de seus negócios particulares com os da petroleira, pelo Comitê de Elegibilidades (Celeg). Substituídos às pressas, os dois novos nomes também não vingaram ao não segurarem os preços dos combustíveis (o que acelera a inflação, calcanhar de Aquiles da rejeição do eleitor a Bolsonaro).

Os controles criados após a Lava-Jato barraram as intermediações de verbas eleitorais pelas empreiteiras e grandes empresas, mas Jair Bolsonaro, cacifado com o bilionário pacote de benesses eleitorais para seduzir milhões de eleitores a mudarem o voto, de olho no 3º maior colégio eleitoral do país, o Rio (onde está perdendo para Lula, assim como em São Paulo, o maior, e Minas Gerais, o 2º), e no apelo à camisa rubro-negra, acena com facilidades junto à estatal Caixa Econômica Federal, dona do terreno onde o Gasômetro foi desativado há duas décadas, no Centro do Rio, em frente à Rodoviária, para negociar a área para o Flamengo construir estádio próprio para 50 mil espectadores. Habitual palco da torcida rubro-negra, o Maracanã, reformado para a Copa de 2014, tem capacidade máxima de 78 mil espectadores, mas não opera em carga máxima. O estádio, do governo do estado, é explorado pelo clube, em regime de concessão, em parceria com o Fluminense. Mas o governador Cláudio Castro, em campanha de reeleição (era vice de Wilson Witzel, que sofreu “impeachment”), com apoio do senador Flávio Bolsonaro, tenta abrir espaço para o Vasco da Gama, dono da 2ª maior torcida do estado, também utilizar o estádio (o gramado, que não comporta mais de dois jogos semanais, teve de ser refeito uma semana após o uso pelo Vasco em jogo da série B).

No desespero para arrancar votos até das pedras - a conclusão de 10% das obras de transposição das águas do São Francisco para o Nordeste, iniciada com Lula e continuada com Dilma e Temer, não jorrou votos esperados na região cada vez mais fiel ao pernambucano Lula -, o governo em campanha partiu para a intervenção nos preços da energia elétrica, telecomunicações e combustíveis, para baixar a canetadas a inflação que resiste na alimentação e nos serviços. O governo ainda conta com os efeitos do dinheiro pingando nos bolsos dos eleitores. Para criar uma “ola” da torcida rubro-negra, Bolsonaro já adiantou que pretende acionar o Exército para que ceda uma área vizinha à detida pela CEF no antigo terreno do gasômetro. Assim, haveria espaço suficiente para o clube construir um complexo comercial, com shopping center e amplo estacionamento, capaz de reduzir os custos operacionais de um estádio nos dias de ociosidade - o grande problema do Maracanã e dos elefantes-brancos.

O torcedor é volúvel e se deixa levar pela paixão nos estádios. Mas, na hora de votar, as camisas costumam ser deixadas de lado. E não adianta chamar o VAR.