A extrema direita golpista não veio de Marte
Não vieram do planeta Marte nem são lunáticos os caminhoneiros que bloqueiam estradas, seus financiadores e os grupos de pessoas vestidas de verde e amarelo acampadas na frente de quartéis militares, questionando o resultado das eleições que deram vitória a Luiz Inácio Lula da Silva. Pode parecer ridículo o que fazem: a eleição foi encerrada, Lula declarado vencedor pelos tribunais, reconhecido e consagrado mundo afora.
O persistente ativismo antidemocrático destes grupos mostra que a extrema direita pôs a cabeça e o corpo para fora e age de forma organizada e golpista. Com o apoio velado de comandantes militares e do presidente derrotado, recluso no Palácio da Alvorada, pretendem tumultuar o processo de transição. Agem para criar um ambiente de instabilidade política que favoreça uma intervenção militar.
Nos últimos dias, passaram a fazer vídeos de seus integrantes - logo postados nas redes - correndo atrás nas ruas de ministros dos tribunais superiores, STF e TSE. Que são xingados e ameaçados fisicamente. Trata-se de grupelhos de desocupados, alguns mercenários devidamente pagos, financiados e catequizados por ideólogos de direita fascista, inconformados com o resultado da eleição.
Apático e depressivo, Jair Bolsonaro finge-se de morto no Palácio da Alvorada: não aceita a derrota, abandonou suas funções, não exerce o papel institucional que lhe cabe, não tem agenda e não se comunica com o país, que ainda o tem como presidente. Assessores temem que não conclua seu mandato. O que está fazendo ali senão destruindo arquivos e conspirando com o general Heleno, chefe do gabinete de Segurança Institucional?
Tornou-se um fantasma aprisionado no Alvorada, que encena um teatro de proximidade com os comandos militares, enquanto Lula é ovacionado e reconhecido como uma liderança mundial em sua apresentação na Conferência do Clima, no Egito. A qualquer momento ele pode fazer um comunicado, aparecer numa live convocando os fanáticos membros de seu seus grupos de ativistas para dar início a uma marcha motorizada sobre Brasília, como fizeram os seguidores de Benito Mussolini sobre Roma.
É urgente que o Estado Democrático de Direito se defenda e imponha limites a esta balbúrdia da extrema direita terrorista. É urgente que seus integrantes sejam identificados, chamados publicamente pelos nomes, tenham seus CPFs revelados, suas contas bloqueadas e sejam investigados criminalmente. Quem são os empresários que financiam as ações, pagam deslocamentos, banheiros químicos, alugam caminhões e carros de som?
Por iniciativa do ministro Alexandre Moraes, do STF, relatórios enviados pelas polícias Militar, Federal e Civil, e pelo Ministério Público, começam a revelar os primeiros nomes. São citados como responsáveis pelos atos antidemocráticos políticos, policiais, fazendeiros, empresários do agronegócio, sindicalistas, servidores públicos e donos de estandes de tiro. Não são marcianos nem extraterrestres que desceram de um disco voador. Fazem parte de uma extrema direita organizada, que usa um discurso de ódio para atacar a democracia.
Fora do poder, o bolsonarismo se dividirá. Sobrarão os grupos bajuladores e fanáticos de rua, fora do controle do governo omisso e silencioso e do próprio Bolsonaro. Não se conformam com a vontade majoritária do eleitorado, atuam cada vez mais na ilegalidade, instigados por ações e omissões do próprio presidente, idealizado como mito.
Em suas manifestações violentas e intolerantes, podem comprometer o regime democrático, que enfrenta o desafio de renascer depois de quase sepultado nos quatro anos de Bolsonaro. Contra os extremistas, o Estado deve baixar o sarrafo da aplicação da lei penal.
O grande feito de Lula foi vencer a eleição e afastar a sombra de uma ditadura de extrema direita sobre o país. A tarefa de preservar a liberdade e a democracia é de todos, da sociedade e das instituições, que necessitam dela para viver.
*Jornalista e escritor