The Hot Sardines e a harmonia dos tempos
O ano era 2014, mais precisamente na última semana de março, em Nova York. O céu estava nublado, temperatura fria, ainda com resquícios do forte inverno. Decidi comemorar meu aniversario na “cidade que nunca dorme”, e estava em busca de um bom programa para celebrar mais um ano de vida, ao lado da minha esposa Carolina. O local escolhido foi o Boom Boom Room, que fica no último andar do badalado hotel The Standard, na parte baixa da ilha de Manhattan.
Sem consultar a programação (e também sem fazer reserva), chegamos ao local, em uma segunda-feira, e a casa estava lotada. Após alguma espera, conseguimos entrar e, logo de cara, a banda, que esquentava todo o público presente, chamou minha atenção. O som remetia ao jazz dos anos 30, mesclando influências de Paris, Nova Orleans e claro, Nova York, e alternando clássicos e músicas autorais. Era a primeira vez que assistia, entusiasmado, a banda The Hot Sardines.
A história da banda em comento poderia figurar um filme americano de sucesso, quiçá uma obra de Woody Allen. Um ator e pianista, nascido e criado em Nova York, conhece, na calada da noite, uma cantora e escritora parisiense, em uma “jam” em Manhattan, no ano de 2007. A sinergia foi tamanha, que Evan Palazzo e Elizabeth Bougerol se uniram para criar este fenômeno jazzístico, considerado uma das grandes revelações dos últimos anos.
O grande diferencial da banda é sua capacidade de tocar uma música “vintage” com arranjos e performances que nos fazem acreditar que foram escritas recentemente. A intensidade, aplicada ao jazz tradicional, faz com o som ganhe mais vida e prenda a atenção (e os ouvidos) de qualquer plateia. O nome foi uma homenagem ao “Hot Five and Hot Sevens”, de Louis Armostrong, misturado a uma deliciosa lata de sardinhas picantes, que Elizabeth tinha encontrado num mercado.
Após o primeiro disco, “Shanghai’d”, em 2011, a banda seguiu criando excelentes trabalhos e percorrendo turnês pela América e também pela Europa. O disco “The Hot Sardines”, lançado em 2014, é um dos meus favoritos, com versões maravilhosas de “Petite Fluer” e “Wake Up in Paris”.
No mês passado, a banda lançou seu mais recente trabalho, “Welcome home, Bom Voyage” gravado, ao vivo, em dois locais emblemáticos para a banda. O primeiro é o Joe's Pub em Nova York, o primeiro local que realmente deu uma oportunidade para que pudessem tocar, e o Koerner Hall, em Toronto, no Conservatório Real de Música, local onde eles esgotaram os ingressos em pouco mais de um dia.
Os destaques do disco incluem faixas tradicionais como, “Everybody Loves My Baby” (gravado por Louis Armstrong, em 1924) e “Caravan”, do mestre Duke Ellington. “After you’ve gone” de Ella Fitzgerald, é uma das minhas músicas favoritas. Seguindo a linha dos clássicos, na companhia de David Berger (bateria, percussão), J. Walter Hawkes (trombone), Noah Hocker (trompete), AC Lincoln (toque), Jason Mercer (baixo), Nick Myers (saxofone tenor, clarinete, conga), a banda encerra o show no Koerner Hall com uma segunda linha, transformando o show numa autentica parada de Mardi Gras (o carnaval de Nova Orleans), deixando as mais de 1.200 pessoas em completo frenesi.
Segundo Evan, a possibilidade de tocar uma música que envolva pessoas de “17 ‘aos 97 anos”, advindas dos mais diversos locais e culturas, é um privilegio.
Que a maravilhosa harmonia musical de The Hot Sardines siga nos surpreendendo ainda por muito tempo. Quem sabe no próximo aniversário não os visito novamente?
BEBOP
Celebrando Carlos Lyra
Nesta sexta-feira, o Blue Note Rio recebe o cantor e compositor Carlos Lyra, que completa 86 anos em uma noite repleta de convidados, como Marcos Valle, João Donato, Paula Morelembaum, entre outros. O show marca também o lançamento de seu mais novo disco, “Além da bossa”.
Theo Croker
O disco Star People Nation, do incrível trompetista Theo Croker, teve seu lançamento marcado para dia 17 deste mês. Altas expectativas para o novo trabalho desta revelação de apenas 33 anos.
Robert Johnson
A Netflix lançou o documentário “ReMastered: O Diabo na Encruzilhada”, que fala sobre a misteriosa vida do cantor e guitarrista de Blues Robert Johnson. Para aqueles que não o conhecem, é obrigatório assistir e mais ainda, escutar o som deste gênio da música, reverenciado por décadas por grandes nomes do blues e outros gêneros.