As adaptações de Fred Hersch

Thiago Goes ( [email protected] )

Ainda falando um pouco sobre Nova York, onde estive semana passada, foi realmente um prazer poder vivenciar tantas experiências musicais a poucos passos de distância. Estes momentos nos fazem conhecer bem mais sobre os músicos e mergulhar em seus universos criativos. Escrevi, no ano passado, sobre um disco do pianista Fred Hersch (97@VillageVanguard), uma gravação ao vivo de seu trio no lendário Village Vanguard. Ali pude me familiarizar com seu som e admirar sua história de superação devido aos graves problemas de saúde.

Eis que lá estava Hersch novamente, no Vanguard, na última semana, comemorando dez anos de sua residência anual no templo jazzístico. Depois de um show absolutamente fantástico na cia do baixista John Hébert e do baterista Eric McPherson, fiz questão de parabeniza-lo, contando sobre minha coluna e mostrando a crítica de seu disco. Fred então, rapidamente, retruca: “Não deixe de escutar Begin Again, meu último trabalho gravado este ano. Foi um trabalho diferente e um desafio encantador”. Missão dada é missão cumprida, certo?

Gravado no final de janeiro e lançado em junho deste ano, o disco de fato mostra um outro lado de Hersch, costumeiro líder de trios e pequenos grupos. Desta vez, o pianista apresenta nove belas composições remodeladas pelo arranjador e maestro Vince Mendoza, vencedor por seis vezes do Grammy, que já trabalhou em álbuns de Robbie Willians, Elvis Costello, Bjork entre outros. Acrescente a esta mistura a imponente big band alemã WDR, considerada pela revista DownBeat como um dos melhores conjuntos de jazz da Europa, e o resultado é um ótimo material a ser desbravado.

O disco abre com a faixa título, única não gravada por Hersch anteriormente, explorando vozes distintas e abrindo espaço para os ótimos solos da WDR, em especial os saxofonistas Johan Hörlén e Karolina Strassmayer, o tenor saxofonista Paul Heller, os trompetistas Ruud Breuls e Andy Haderer, os trombonistas Ludwig Nuss e Andy Hunter, e o baterista Hans Dekker.

Com 17 músicos a disposição, a criação das peças ganha uma enorme variedade, ampliando suas singularidades. “Song Without Words # 2: Ballad”, cujo nome já ressalta o perfil de balada jazzística, já evidentemente saltou nas minhas preferências. Muito embora a influência não tenha sido declarada diretamente por Hersc, o disco me remete à Havana, que também foi gravada, pela primeira vez, no Vanguard, em 2011, e traz toda efervescência da Rumba. A sombria “Out Someplace”, desvenda as horrendas horas finais de Matthew Shepard, um homem gay que foi brutalmente assassinado, em Wyoming, em 1998. Homossexual e portador do vírus HIV, Hersch é um dos grandes ativistas das causas LGBT ao redor do mundo.

“Rain Waltz", faixa mais antiga do disco, nos leva ao início dos anos 80 e mostra Hersch adaptando trabalhos de génios como Thelonious Monk e Wayne Shorter. “The Big Easy” faz a justa homenagem à New Orleans, com seu Groove e gingando, e “The Orb” fecha o disco com Hersch imerso no piano-solo, em uma faixa que remete a uma carta de amor a seu antigo parceiro Scott Ninmer. Uma melodia encantadora fecha o disco, com o brilhantismo merecido deste pianista, que mostra sua capacidade de adaptação a qualquer formato musical.

Mal posso esperar pela próxima adição a seu catálogo. 

BEBOP

Agenda

O Smoke Lounge, na Tijuca, segue com ótimas programações jazzísticas durante a semana. Hoje é dia do “Bebop Jazz”, com o quarteto liderado por Yumi Park, tocando clássicos do gênero, a partir das 20h.

Agenda 2

O CJUB, confraria de amigos amantes do jazz e da bossa nova, no dia 16 de agosto, leva ao Manouche o ilustre Duduka da Fonseca, único baterista brasileiro indicado ao Grammy americano. Ele se apresenta em trio, com o ótimo David Feldman ao piano e Guto Wirtti no contrabaixo. Programa imperdível.

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