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Mostra em Itaipava trata das formas do ?lme

Evento teve homenagem a Ruy Guerra, com debate com o cineasta de “Os fuzis”

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De quinta a sábado, Itaipava, distrito de Petrópolis,  acolheu a mostra “Linguagem em Foco”, com sessões de cinema seguidas de debates. Realizado no Cine Itaipava, o ciclo de filmes teve como proposta ressaltar e discutir aspectos formais do cinema. 

O evento reuniu diretores brasileiros de diferentes gerações, como Eduardo Nunes, Diogo Oliveira, Coletivo Foras de Quadro e o grande homenageado do festival, Ruy Guerra. No sábado à noite, o diretor de “Os fuzis” (1964) esteve no local, em uma sessão de autógrafos com sua biógrafa, a historiadora aposentada da Unicamp Vavy Pacheco Borges, que em 2017 lançou  “Ruy Guerra: Paixão escancarada” (Boitempo). 

Perguntado pelo JORNAL DO BRASIL sobre o tema do festival, Guerra, 86, um dos grandes inovadores do cinema brasileiro, afirmou que forma e conteúdo sempre andam juntos, embora nem sempre isso signifique coisas boas. “Estudo isso há mais de 40 anos. Para um conteúdo novo, tem que haver uma nova forma. O problema é que geralmente se olha para a sociedade com uma forma já envelhecida e isso faz com que o conteúdo não seja transmitido. Não existe conteúdo novo com uma forma velha”, disse. 

Vavy, que passou dez anos para escrever a biografia de Guerra, com a realização de 150 entrevistas em três continentes (América, Europa e África), observou que o cinema de Guerra se distingue por uma “atenção muito grande às relações sociais e de classe. Todo homem é um homem político, mas Guerra é um dos cineastas mais politizados da história do cinema brasileiro”, afirma.

A historiadora disse que, quando resolveu fazer a biografia, obteve autorização do cineasta, sob a condição de “não deixar tudo arrumadinho demais”. A pesquisadora de 81 anos afirmou que seguiu a exigência. “Não estou procurando um herói, mas um homem. Gostamos de chamá-lo de leão, porque ele nasceu em Moçambique, é leonino e tem uma grande vitalidade. [Guerra] não é uma pessoa fácil, mas incrivelmente interessante”, opina.

O cineasta afirmou que acha “um pouco estranho” virar biografia ainda em vida, porque em geral isso acontece após a morte. Ele disse que, todavia, “não dá muita importância a isso” e que “tem cuidado com o ego”, de modo a não se afetar negativamente pela vaidade. 

Em abril, Ruy lançou “Quase memória”, filme que demorou quase dez anos para ficar pronto. O diretor afirmou que foi o seu projeto com maior dificuldade para captar recursos. “Não há dinheiro para fazer filmes. Não existe uma economia cinematográfica brasileira, somente apoios oficiais muito pequenos e escassos. Se a pessoa não for rica, como eu não sou, não consegue filmar”, afirmou. 

O festival apresentou curtas do Coletivo Foras de Quadro, o filme “Sudoeste” (Eduardo Nunes, 2011) e “O homem que matou John Wayne” (2017),  de Diogo Oliveira, sobre a vida e a obra de Guerra. 

Segundo a organizadora e curadora Beatriz Ohana, a iniciativa de discutir aspectos formais do cinema é pouco comum em Petrópolis. “Acontecem vários festivais por aqui, mas os debates sempre falam só sobre os temas dos filmes, e não sobre como eles são realizados”, disse ela, que foi aluna dos três cineastas quando estudou na capital e recorreu ao financiamento coletivo para bancar o evento.