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Rio dobrou gastos em policiamento, em detrimento de investimento em tecnologia

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O gasto com policiamento no Rio de Janeiro mais do que dobrou de 2015 para 2016, passando de R$ 252,73 milhões para R$ 579,99 milhões, segundo dados do 11º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, o mais recente. Já o investimento em “Informação e Inteligência” tem sido um dos menores entre os 27 estados. Em 2015, foram apenas R$ 23.532, o que deixou o Rio em penúltimo lugar, entre os 19 que destinaram alguma verba para a rubrica, ficando à frente apenas de Tocantins, que aportou míseros R$ 579,99. Em 2016, o aporte em Inteligência foi nulo. A cifra investida em “inteligência” em 2015 foi  dez vezes menor do que as despesas com “policiamento” naquele ano. Para especialistas, o aporte de recursos em Inteligência do Rio é ínfimo e revela prioridade para as gastos com repressão, enquanto a prevenção foi negligenciada. 

O quesito “Inteligência” refere-se a aquisições de sistemas de Big Data, informatização e construção de bases de dados, fundamentais para o planejamento, monitoramento e avaliação das políticas públicas e ações na área de segurança. Ainda segundo especialistas, não inclui ações de inteligência - incluídas na rubrica “Policiamento”. 

Membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e doutorando em Políticas Públicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Alberto Kopittke diz que um policiamento que contemple o mínimo de prevenção precisa de investimentos em inteligência. Do contrário, a política de segurança estará sempre refém do crime: 

“Quando não se investe em inteligência, o policiamento fica reativo, atendendo apenas a crises e chamados. O investimento em inteligência aumenta a capacidade preventiva das polícias e produz mais resultados”. 

Para ele, o principal avanço do Rio, na seara da informatização, foi o projeto “Delegacia Legal”, de 1999, responsável por integrar as bases de dados dos registros de ocorrência (ROs) de todo o estado. Antes disso, os ROs não eram digitais. Desde então, não houve grandes investimentos. Para ter mais êxito, a Polícia Civil precisa de softwares mais modernos, além de integração de suas bases de dados com a Justiça e o Ministério Público. 

Presidente do Sindicato dos Policiais Civis do Estado do Rio de Janeiro (Sindpol-RJ), Márcio Garcia conta que o sistema implantado nas delegacias em 99 não teve atualizações: 

“Nas delegacias, o sistema tem a mesma tecnologia de 20 anos atrás, que é ineficiente, fica lento e cai o tempo todo. Sem o sistema funcionando direito, a população espera horas por um registro. Além disso, a polícia não consegue investigar com eficiência por conta da defasagem tecnológica e lentidão na resposta das consultas aos sistemas”, denuncia. “A inteligência é a alma da investigação e a investigação é a atividade fim da Polícia Civil. As duas estão em calamidade, o que culmina na violência desenfreada no Rio. Os criminosos ficam impunes e já perceberam essa vulnerabilidade. Estão cada vez mais ousados”.

O cenário na PM é pior, segundo o coronel da reserva Robson Rodrigues, ex-chefe do Estado Maior. A corporação só tem acesso à base de dados de crimes já ocorridos, sembase para o policiamento preventivo: “É fundamental a PM ter uma base de dados com informações antes de as ocorrências virarem crimes, como já acontece nas polícias modernas. São dados de denúncias e chamados, que precisam ser armazenados e são úteis para prevenir o crime. Mas não se tem nem banda larga direito. O fornecimento de internet dos batalhões é interrompido toda vez que o pagamento do serviço é atrasado, imagine se teremos um banco de dados preventivo. Estamos enxugando gelo, com uma estratégia equivocada, só com polícia na rua. O que orienta todas as ações deve ser a inteligência, sinônimo de prevenção, que foi abandonada”

Procurada para explicar o baixo investimento em “Inteligência”, a Secretaria de Segurança Pública do Rio (Seseg) informou, por nota que, de 2010 a 2017, houve um aporte de cerca de R$ 15,2 milhões no setor. Segundo o informe, “o valor contribui não só para aquisição de equipamentos e na manutenção de serviços essenciais, como no acompanhamento sistemático de ações que resultaram na apreensão recorde de 499 fuzis ao longo do último ano, assim como na prisão de (...)Marcelo Piloto, em dezembro último”. Porém, segundo dados dos cinco relatórios anuais mais recentes do Fórum Brasileiro de Segurança, o aporte no setor soma só R$ 114.215,14, no período de 2010 a 2016. Os dados de 2017 ainda não foram divulgados. Nos anos de 2011 e 2016, o investimento na rubrica “Inteligência” foi nulo. A diferença de valores apresentada pelo Fórum e pela Seseg está no entendimento do que é considerado “Inteligência”. Pela nota da Seseg, conclui-se que a pasta contabilizou o investimento com ações de inteligência, ou seja, as investigações da própria polícia, diferentemente do Fórum. Tais investigações, a julgar pelo volume de investimentos em equipamentos, não tiveram recursos necessários para dar suporte adequado aos agentes.